Ex-servidor do TJMS é condenado por receber R$ 125 mil para interferir em processo

A Justiça condenou um ex-servidor do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul por enriquecimento ilícito ao receber R$ 125 mil para obter informações privilegiadas de processo em tramitação na corte. A sentença determinou o perdimento do total de R$ 125.100,00 pelo condenado e o pagamento do mesmo valor como multa civil.

O caso envolve um processo que começou a tramitar em 2009 em Caarapó, relativo a partilha de bens entre dois irmãos. O advogado André Luiz Germano Amaral de Godói foi acusado de usar seu cargo no TJMS, como assistente executivo do desembargador Luiz Tadeu Barbosa da Silva, para beneficiar uma das partes.

Conforme a denúncia do Ministério Público Estadual, em julho de 2010, a 1ª Vara da Comarca de Caarapó negou pedido de reintegração de posse referente a partilha de bens deixados pelo pai de três irmãos. Os derrotados entraram com recurso de apelação, que foi distribuído para a 5ª Câmara Cível do TJMS.

O relator do caso foi o desembargador Luiz Tadeu Barbosa da Silva. A apelação foi acatada por maioria, o revisor, Sideni Pimentel, emitiu voto divergente, culminando em recurso da outra parte na ação, que chegou à 1ª Seção Cível, que manteve o acórdão proferido pela 5ª Câmara Cível.

Após a decisão transitar em julgado, a Corregedoria-Geral de Justiça do TJMS recebeu uma denúncia anônima, em abril de 2012, relatando que André Luiz Germano Amaral de Godói, na condição de assistente executivo do desembargador Luiz Tadeu Barbosa da Silva, teria recebido R$ 300 mil para interferir no julgamento do recurso.

André Godói, junto com o colega Fernando Massi de Oliveira Lima, teria informado a José Manoel Mateus Sandin que poderia ajudá-lo no processo, alegando que os assessores preparam os votos dos desembargadores. 

O denunciante também enviou cópia de um cheque de R$ 25 mil, emitido por José Sandin em nome da esposa de André Luiz Godói.

Dias depois da denúncia anônima, o assessor do TJMS foi exonerado do cargo. O caso foi repassado à Polícia Civil, cujo inquérito foi concluído em 3 de dezembro de 2012. 

Durante a investigação da polícia, foi apurado que em abril de 2011, José Valter de Andrade Pinto, então advogado de José Manoel Mateus Sandin, esteve no gabinete do desembargador Barbosa Silva para contatar André Luiz, solicitando conversa reservada para propor pagamentos em troca de informações sigilosas sobre os votos antecipados dos desembargadores.

André Godói relatou o ocorrido ao colega Fernando Massi de Oliveira Lima, advogado de seu círculo de conhecimento, ajustando-se entre ambos um acordo para recebimento dos valores referentes às informações sigilosas eventualmente colhidas.

O quarteto – André Luiz Germano Amaral de Godói, Fernando Massi de Oliveira Lima, José Valter de Andrade Pinto e José Manoel Mateus Sandin – foram denunciados na 6ª Vara Criminal e na 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, nesta última por improbidade administrativa.

Sentença

Nesta quarta-feira (10), foi publicada a sentença do juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, que condenou André Luiz Godói por improbidade e absolveu os outros três acusados. Para o magistrado, ficou comprovado que o ex-servidor do TJMS recebeu vantagem indevida em razão do cargo.

“De fato, houve o pagamento de valores pelo requerido José Manoel Mateus Sandin ao requerido André Luiz Germano Amaral de Godói por meio de depósitos de valores e de cheques de titularidade do primeiro ou de terceiros com quem mantinha negócios (mediante endosso) realizados na conta bancária de titularidade do segundo e de sua esposa”, diz o titular da  1ª Vara de Direitos Difusos.

A quebra de sigilo bancário revelou que a esposa de André Luiz Godói recebeu em suas contas R$ 125.100,00, sendo que algumas lâminas de cheques foram devolvidas por sustação ou insuficiência de fundos. 

Em interrogatório, José Manoel Mateus Sandin confirmou os pagamentos, o que foi corroborado por um funcionário da agência bancária localizada nas dependências do Tribunal de Justiça.

José Manoel, porém, alegou que o depósito foi feito para a contratação de assessoria jurídica.

Pesou também contra André Luiz Godói, o depoimento do desembargador Luiz Tadeu Barbosa da Silva na ação na esfera criminal, prova compartilhada com a Vara de Direitos Difusos, em que diz que o ex-assessor valeu-se do acesso que tinha ao processo de partilha e a outros servidores ou gabinetes do TJMS em razão da função que desempenhava no gabinete.

“O depoimento do desembargador Luiz Tadeu Barbosa da Silva, ouvido na qualidade de testemunha, deixa evidente que o requerido André Luiz Germano Amaral de Godói buscou se valer da função de confiança que exercia para ter acesso ao processo, ao teor dos votos proferidos e até mesmo a servidores lotados em outros gabinetes a fim de obter informações sobre o julgamento dos recursos alhures mencionados, inclusive reconhecendo, posteriormente, o uso indevido de sua função pública dentro do gabinete do referido magistrado, sendo exonerado da função no dia 17.02.2012”, relata Ariovaldo Nantes Corrêa.

“Não se pode olvidar que o requerido André Luiz Germano Amaral de Godói apenas teve conhecimento da ação, do conteúdo do processo e do teor dos votos proferidos pelos desembargadores em razão da função que desempenhava no gabinete do Desembargador Luiz Tadeu Barbosa da Silva na época dos fatos descritos na inicial, o que deixa evidente que recebeu, direta ou indiretamente, vantagem indevida em razão do mau uso da função de confiança que desempenhava”, prossegue o magistrado.

Em sua defesa, André Luiz alegou que os valores depositados em sua conta eram desconhecidos e que teria sido utilizado como “laranja” por pessoas importantes no âmbito do Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul.

Ariovaldo Nantes, no entanto, considerou a justificativa como “totalmente destoantes da prova carreada aos autos”.

“Ainda mais considerando que houve diversos depósitos de cheques de titularidade ou endossados pelo requerido José Manoel Mateus na conta bancária de titularidade da cônjuge do primeiro, Aline Correa de Godói Amaral, não havendo como negar que o agente público foi, direta ou indiretamente, beneficiário de tais valores com plena ciência da situação”, afirma o juiz.

A respeito de Fernando Massi de Oliveira Lima, a sentença considera que a prova colhida não permite concluir que o advogado “tenha induzido ou concorrido para a prática dos atos perpetrados” pelo colega, “tampouco que tenha se beneficiado, ainda que indiretamente, de eventual vantagem indevida em razão de cargo, função ou emprego público”.

José Manoel Mateus Sandim e José Valter Andrade Pinto afirmaram em seus interrogatórios que sequer conheciam Fernando Massi de Oliveira Lima antes das investigações e da ação.

Fernando Massi de Oliveira Lima, José Manoel Mateus Sandim e José Valter de Andrade Pinto foram absolvidos das acusações de improbidade.

“Não restou configurado em relação aos requeridos Fernando Massi de Oliveira Lima, José Manoel Mateus Sandim e José Valter de Andrade Pinto, pois nenhum deles exercia cargo, função ou emprego público tampouco era conhecedor de informação ou segredo decorrente de atribuição pública, de modo que não poderiam revelar tal conteúdo a terceiros, sendo que no caso dos autos eventual “revelação” teria que partir do requerido André Luiz Germano Amaral de Godói, por ser o único agente público do polo passivo”, avalia o juiz.

Desta forma, apenas André Luiz Germano Amaral de Godói acabou condenado por ato de improbidade administrativa que importa em enriquecimento ilícito. 

A sentença do juiz Ariovaldo Nantes Corrêa determinou o perdimento do valor total de R$ 125.100,00 do condenado e o pagamento de igual montante como multa civil, com correção monetária e juros de mora pela Taxa Selic a partir do evento danoso, 31 de maio de 2011, data em que realizado o primeiro depósito bancário. 

Os acusados e o Ministério Público Estadual podem recorrer da sentença.

Fonte: O Jacaré

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