ADI sobre reforma previdência estadual pode ser julgada em breve no STF

Tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI-5843) que questiona aspectos formais e materiais da Reforma da Previdência Estadual de Mato Grosso do Sul. A reforma foi sancionada pelo ex-governador Reinaldo Azambuja (PSDB), em dezembro de 2017. Na época, o Fórum dos Servidores Públicos contestou o projeto que foi aprovado, às pressas, pelos deputados estaduais na véspera do recesso parlamentar. 

O Fórum dos Servidores —órgão que reúne diversas entidades representativas de servidores públicos como educação, saúde, segurança pública, judiciário, legislativo e administrativo em assuntos em comum — buscou o debate junto ao governo e até mesmo mobilizou a categoria para reivindicar a retirada do projeto. O que não foi suficiente para convencer os deputados a interromper a tramitação da reforma.

Dentre as mudanças propostas pelo Projeto de Lei (PL) 253/2017, esteve o aumento da alíquota de contribuição de 11% para 14%, do patronal de 22% para 28%, a criação da Previdência Complementar ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), a revisão do plano financeiro e previdenciário e a sistematização em um plano único.

Os coordenadores do Fórum de Servidores de Mato Grosso do Sul alegaram que a proposta é inconstitucional pois a lei que aprovou a Reforma da Previdência revogou a legislação anterior, Lei Estadual nº 4.213, de 28 de junho de 2012, permitindo que o Poder Executivo se utilize dos valores depositados e capitalizados no plano previdenciário dos servidores estaduais para cobrir obrigações decorrentes de despesas estranhas à sua finalidade legal, colocando em risco a solvabilidade da AGEPREV e, em última análise, a própria subsistência dos servidores públicos estaduais ativos ou inativos e seus pensionistas.

Em breve

Nesta semana, o Jornal Servidor Público MS entrevistou o advogado Régis Santiago de Carvalho, responsável pela ação. Questionado sobre uma previsão do julgamento final da Ação, Régis alegou que pode ser que ocorra em breve, pois a ação está madura para julgamento.

“Ainda não temos uma data definida, mas esperamos que o julgamento ocorra em breve, já que a ação está madura para julgamento e foi proposta em dezembro de 2017. Não há nada que justifique essa demora demasiada no julgamento do mérito da ação”.

A ADI foi ingressada a pedidos dos sindicatos e associações integrantes do Fórum de Servidores Públicos do Estado de Mato Grosso do Sul, no dia 4 de dezembro de 2017, com apoio da Associação Nacional de Entidades Representativas de Policiais Militares e Bombeiros Militares – ANERMB e a Confederação dos Servidores Públicos do Brasil – CSPB perante o Supremo Tribunal Federal com o objetivo de suspender a eficácia dos arts. 4º ao 15, 22 e 23, §1º da Lei Estadual nº 5.101/2017 (Reforma da Previdência Estadual), publicada no Diário Oficial do Estado de MS em 04/12/2017 por manifesta violação aos artigos 24, XII; 37; 40; 70; 149, §1º; 150, IV e 195, §§ 5º e 6º, todos da Constituição Federal de 1988.

Capa do Jornal Servidor Público de dezembro de 2017, após aprovação da reforma

Na ocasião, alguns deputados questionaram a reforma e alegaram até a necessidade de realizarem uma auditoria por parte de uma empresa autônoma e independente do Governo do Estado para fazer um levantamento de como está a previdência dos servidores do Estado de Mato Grosso do Sul.

Entenda

O advogado Régis explicou que a ADI questiona tanto aspectos formais (na fase de elaboração da Lei) como materiais (violação a Constituição Federal) da Lei Estadual nº 5.101/2017, dentre eles, a ausência de preservação do equilíbrio financeiro e atuarial preconizado pela Constituição Federal (arts. 24, XII; 37; 40; 70).

“Além de violação ao artigo 149, §1º, da Constituição Federal, vez que a alíquota patronal prevista na referida Lei (25%) é superior ao dobro da alíquota prevista para o servidor público federal (efetivo da União), fixada em 11%; majoração da alíquota de contribuição previdenciária do regime próprio de previdência social dos servidores públicos estaduais de Mato Grosso do Sul que saltou de 11% para 14%, criando tributo com efeito de confisco, vedado pelo art. 150, IV, da Constituição Federal e ausência de observância ao princípio da correlação entre o valor da contribuição e a correspondente fonte de custeio, previsto no art. 195, § 5º, da Constituição Federal”, afirmou.

Atual andamento da ação

“Nós solicitamos a concessão de uma medida cautelar para suspender liminarmente a eficácia dos dispositivos impugnados (arts. 4º ao 15 e 22 da Lei Estadual nº 5.101/2017) e, consequentemente, para que o Estado de Mato Grosso do Sul fosse impedido de se utilizar de qualquer valor depositado no plano previdenciário criado através da Lei Estadual nº 4.213/2012 até o julgamento do mérito da ADI. Todavia, o Relator à época, Ministro Ricardo Levandowisk, embora tenha reconhecido ‘a conveniência de um julgamento único e definitivo sobre o tema, além da evidente relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica’, preferiu adotar o ‘procedimento abreviado’ previsto no art. 12 da Lei 9.868/1999”.

“Posteriormente a essa decisão, foi admitido o ingresso no feito, na qualidade de ‘amicus curiae’ (terceira interessada), da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Mato Grosso do Sul, da Associação dos Delegados de Polícia de Mato Grosso do Sul – ADEPOL e da Associação dos Oficiais Militares Estaduais do Estado de Mato Grosso do Sul- AOFMS. Com a aposentadoria do Ministro Ricardo Levandowisk, ocorrida em 11/04/2023, o processo foi redistribuído ao Ministro Cristiano Zanin em 03/08/2023 e atualmente aguarda sua inclusão em pauta de julgamento do STF”, complementou Régis.

Decisões favoráveis de outros Estados

“Existe uma decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de Goiás em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pela Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (ASMEGO) que considerou inconstitucional a Lei que majorou a alíquota da previdência de 11% para 14% dos servidores públicos daquele Estado (ADI n° 201390924475)”, disse.

“Essa decisão foi objeto de recurso extraordinário endereçado ao STF, sendo que o Ministro Luís Roberto Barroso, relator do recurso, reconheceu “o caráter constitucional e a repercussão geral do tema ora em exame, qual seja, saber quais são as balizas impostas pela Constituição de 1988 a leis que elevam as alíquotas das contribuições previdenciárias incidentes sobre servidores públicos, especialmente à luz do caráter contributivo do regime previdenciário e dos princípios do equilíbrio financeiro e atuarial, da vedação ao confisco e da razoabilidade”. Nesse ponto, a ação aborda temas bastante parecidos com aqueles objetos da ação proposta a pedido do Fórum de Servidores de Mato Grosso do Sul”, salientou.

Negociação política

“Particularmente, sou um defensor e também entusiasta dos chamados métodos adequados de solução de conflitos. O próprio Código de Processo Civil estabelece que ‘O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos’ e ainda que ‘A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial’. (art. 3º, §§2º e 3º)”.

“No meio jurídico costuma-se dizer que ‘mais vale um mau acordo que uma boa demanda’, e uma boa demanda, sob a ótica dos servidores, deve ser compreendida como aquela que seja rápida e apresente uma solução razoável; daí a importância da manutenção de um diálogo sempre aberto com as autoridades constituídas”.    

Entidade parceiras

Por fim, Régis acredita que a expectativa é boa quanto a um julgamento favorável aos servidores públicos. “Apesar de se tratar de uma demanda complexa, que envolve aspectos jurídicos, econômicos e também políticos, estamos confiantes num resultado que atenda as expectativas dos servidores. A admissão de entidades importantes como a OAB/MS, a ADEPOL e AOFMS na ADI -5843 reforça nossa expectativa pela procedência do pedido. São entidades parceiras, com forte representatividade e também respeitadas no cenário jurídico, que podem contribuir decisivamente para um resultado positivo”, pontuou.

Cenário nacional

Também tramita no Supremo Tribunal Federal outras 13 Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) que questionam trechos da Reforma da Previdência realizada pelo Governo Federal, em 2019, e tiveram os julgamentos retomados em junho deste ano.  Um dos pontos questionados pelas ações no STF trata da cobrança previdenciária de valores abaixo do teto do INSS, que é o regime de Previdência dos trabalhadores da iniciativa privada. Isso porque a Reforma permitiu a cobrança previdenciária dos servidores sobre valores que ultrapassarem um salário-mínimo.

Na questão da cobrança de valores que ultrapassem um salário-mínimo, até o momento foram 6 votos para derrubar essa medida, contra 4 para mantê-la. O julgamento foi suspenso após o ministro Gilmar Mendes pedir vistas — mais tempo para analisar o processo. Além do impacto direto sobre o conjunto do funcionalismo, o julgamento do STF terá outros desdobramentos.

*** Régis Santiago de Carvalho – Advogado, Mestrando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Autônoma de Lisboa (Portugal); Pós-graduado em Direito Constitucional; Especialista em Direito Processual Civil, Direito Tributário e Direito Eleitoral; Professor e Coordenador de Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito; Presidente da Academia de Direito Processual de Mato Grosso do Sul – ADP/MS; Conselheiro Estadual da OAB/MS; Autor e coautor de 6 obras jurídicas e de dezenas de artigos jurídicos; Integrou a Lista Tríplice para o cargo de Juiz Eleitoral Substituto do TRE/MS, na vaga destinada a classe “jurista”, nos anos de 2019 e 2023.

Roberta Cáceres / Jornal Servidor Público MS

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