Ao CNJ, presidente do TJ critica a “morosidade” de juiz e defende desmatamento do Parque

Presidente do Tribunal de Justiça disse que área do novo Palácio da Justiça não é de vegetação nativa (Foto: Arquivo)

O presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, desembargador Sérgio Fernandes Martins, criticou a “morosidade” do juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, por não ter concluído o processo em quatro anos. Em manifestação ao Conselho Nacional de Justiça, ele negou “manobra” para nomear a juíza Elisabeth Rosa Baisch para a vaga de desembargadora em troca da homologação do acordo para desmatar o Parque dos Poderes.

Martins defendeu a proposta que permite o desmatamento de 18,6 hectares do Parque para a construção das obras do Palácio da Justiça, do Palácio do Governo e do batalhão da Polícia Militar. Conforme o magistrado, a área não tem vegetação nativa, conforme alegam os ambientalistas e defensores do meio ambiente.

O desembargador contestou a denúncia feita ao CNJ por Ariovaldo Nantes Corrêa, de que houve manobra para atropelar o processo, ignorando a ordem do juiz natural e os trâmites processuais para validar o acordão feito entre os poderes para permitir as obras megalomaníacas e retirar a vegetação nativa.

Sérgio Martins contra-atacou e pediu para o CNJ apurar a conduta do juiz por ter anulado a sentença de Elisabeth Baisch, que tinha ignorado o prazo para manifestação das partes e homologado o acordo, que permite o desmatamento para construção de palácios e ampliação de estacionamento no Parque dos Poderes.

Conforme o presidente do TJMS, o magistrado usurpou competência de órgão revisor ao rever a sentença da substituta e anular a sentença. A alegação é a mesma usada pela Procuradoria Geral do Estado para pedir a anulação da decisão de Ariovaldo Nantes Corrêa.

Sérgio Martins pede que CNJ apure conduta de Ariovaldo Nantes Corrêa por ter anulado sentença de substituta (Foto: Divulgação)

Morosidade de quatro anos

“Não existe tutela urgente em vigor para impedir a supressão de vegetação arbórea, entretanto o Estado, IMASUL e demais órgãos públicos aguardam desde 2019 a deslinde do feito”, pontuou Martins, na contestação encaminhada ao CNJ.

“O magistrado, autor da representação, admitiu pessoas físicas como assistentes litisconsorciais na referida Ação Civil Pública. Não existe controvérsia sobre matéria de fato, sendo que em 2023 foi entabulado acordo entre as partes e órgãos públicos interessados, no qual o MPE destaca que a construção em áreas já antropizadas atenderiam os interesses buscados proteger na demanda em questão”, explicou o desembargador.

“As novas construções pretendidas abrigariam o novo prédio do Governo do Estado, novo prédio do Tribunal de Justiça, da Defensoria Pública, Procuradoria-Geral do Estado, dentre outros”, contou, sobre as obras que irão ocupar a área desmatada.

Sérgio Martins apresenta uma nova tese, a de que não existe mais vegetação nativa no local. “A área reservada para o novo complexo do TJMS, por exemplo, antigamente foi um clube e quase não possui vegetação nativa (foto). Tal área foi doada pelo governo do Estado ao Poder Judiciário para construção do novo TJMS, sendo que na dita Lei do Parque, a maior extensão desta área já estava reservada para o Batalhão dos Bombeiros. Frise-se que a área fica a poucos metros do atual prédio do Tribunal, que não comporta mais a estrutura necessária no pujante Estado de Mato Grosso do Sul. O Novo prédio ficaria ao lado do Batalhão de Operações Especiais da PM BOPE, aumentando a segurança de todos que utilizam o prédio”, relatou, apesar de ambientalistas terem exibido fotos do desmatamento promovido pelo Tribunal de Justiça.

O presidente do Tribunal de Justiça se junta aos milhares de cidadãos que reclamam da morosidade da Justiça – casos de corrupção levam décadas para serem julgados – e critica a demora na sentença da ação iniciada em 2019.

“Nota-se que a demora na solução do caso, com acordo firmado, não é justificável na vara judicial com menor distribuição de feitos na Capital do Estado de MS. Segundo BI do TJMS, foram apenas 192 novas demandas durante todo o ano de 2023. O acervo total da vara também é diminuto, 530 feitos em julho de 2024, incluindo aqueles suspensos ou que aguardam recursos”, argumentou Martins.

Os titulares das Varas de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos costumam atribuir a demora à complexidade das ações e ao grande volume. Só para ter ideia, uma das 11 ações de improbidade por fraude na Operação Tapa-buracos na gestão de Nelsinho Trad (PSD) tramita há oito anos e possui cerca de 50 mil páginas.

O titular da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de  Campo Grande, juiz Ariovaldo Nantes Corrêa. (Foto: Arquivo/OAB-MS)

Legalidade na substituição

Sérgio Martins rechaça a suspeita de que houve ilegalidade na indicação de Elisabeth Baisch para substituição. “O juiz substituto legal para assumir a presidência temporária do processo em discussão, seria da 2ª Vara de Direitos Difusos, mas também estava em gozo de férias em janeiro de 2024 (juiz Marcelo Ivo). Na sequência, seria a vez do o juiz da Vara de Falências e Precatórias Cíveis da Capital (juiz José Henrique Neiva), também em férias. Finalmente, o último na ordem de substituição prevista no ato administrativo seria o magistrado da Vara de Execuções Fiscais Municipais (juiz Wagner Mansur), que recusou assumir tal encargo, como ocorre há anos, sem assumir substituição remunerada”, relatou.

Houve a indicação da juíza Sandra Artioli, mas a magistrada acabou não assumindo em decorrência de problemas de saúde. Então, o presidente do Tribunal de Justiça indicou Elisabeth por ser a mais antiga na escala.

“Cabe asseverar ainda, que o esgotamento da ordem de substituição ou recusa de magistrados em atuar com acúmulo de competências não é tão incomum, de modo que basta examinar os registros funcionais do juiz autor do pedido de providências para concluir que o magistrado Ariovaldo Nantes Correa já exerceu a substituição nos mesmos moldes”, apontou.

“Portanto, causa perplexidade que a relação processual iniciada em 2019, com proposta de acordo apresentada em 2023, seja objeto de tamanha celeuma em decorrência do julgamento da controvérsia pela juíza durante as férias do titular”, ponderou Martins.

Não houve votação combinada

Martins nega que houve favorecimento à Elisabeth Baisch na promoção ao cargo de desembargadora porque a votação foi acirrada no Tribunal Pleno. “As imputações de supostos atos ilegais por parte da magistrada Elisabeth nada mais são que exercício da jurisdição passível de controle jurisdicional via recursos previstos na legislação. Foram apresentadas sérias suposições de favorecimentos por administrações do Tribunal e mesmo votação ‘combinada’ pelo Tribunal Pleno desta Corte de Justiça. A ata da sessão de votação da promoção indica votação acirrada entre as mulheres da primeira promoção com base na paridade de gênero regulada pela Res. 525/23 do CNJ. A juíza Elisabeth era a segunda mulher mais antiga inscrita na promoção, sendo que a juíza Sandra Artioli era a mais antiga e atualmente ocupa vaga no TRE-MS”, relatou.

Ariovaldo usurpou competência de corte revisora

Martins acusa o juiz titular da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de ter cometido ilegalidade ao anular a sentença favorável ao desmatamento do Parque dos Poderes.

“Em contrapartida, fato que não foi detalhado pelo autor da representação é que o mesmo teria anulado a sentença da colega de mesma instância, arvorando-se na condição de Corte de Revisão”, denunciou.

“Com o retorno das férias do magistrado Ariovaldo Nantes Correa, foram apreciados embargos declaratórios com efeitos infringentes, que os assistentes teriam questionado a competência da juíza que julgou o feito, homologando o acordo. Sem consultar o Conselho Superior da Magistratura a respeito das razões para a substituição ter ocorrido pela magistrada Elisabeth R. Baish, o juiz Ariovaldo ‘anulou’ a decisão da colega de mesmo grau de jurisdição, afastando-se das regras recursais”, afirmou o desembargador, perplexo.

“Assim, apresentados os necessários esclarecimentos, as ilações apresentadas no presente pedido de providências padecem de um mínimo de indicativo de irregularidade administrativa, motivo pelo qual requer-se o arquivamento do feito e eventual verificação da atuação do magistrado Ariovaldo Nantes Correa ao anular a sentença homologatória da colega de mesmo grau de jurisdição”, pediu.

O processo está concluso para o corregedor-geral de Justiça no CNJ. O ministro Luiz Felipe Salomão passa o bastão para o novo corregedor-geral de Justiça, Mauro Campbell, no dia 3 de setembro deste ano.

Desmatamento do Parque dos Poderes segue no centro da polêmica: destruir ou preservar (Foto: Arquivo)

Fonte: ojacare.com.br/By Edivaldo Bitencourt

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