Decisão do STF sobre imprensa começa a gerar seus “Gremlins”

A decisão do STF que restringiu a liberdade de imprensa começou a gerar filhotes macabros. Lembra claramente o filme Gremlins, que marcou uma geração. A partir do momento em que se faz algo indevido, como molhar ou comer após a meia noite, o bichinho lindo se transforma num Gremlin, um pequeno monstro. Ele se reproduz de maneira incontrolável.

Em 1968, na votação que decidiu pelo AI-5, o jornalista Pedro Aleixo foi o único a votar contra. Ouviu de todas as demais autoridades apelos emotivos e contundentes para a necessidade de conter o comunismo. Deixavam claro que a cúpula não cometeria excessos, seria apenas aquela única exceção necessária diante de tempos difíceis.

A resposta de Pedro Aleixo é uma profecia: “General, o que me preocupa não são os generais, é o guarda da esquina”. Então explicou o que queria dizer. Fiz questão de colocar esse áudio histórico no Narrativas Antagonista de hoje. 

O problema da decisão do STF é a mudança de paradigma. Ficou decidido que, no Brasil, a liberdade de imprensa não é um conceito claro, depende da interpretação dos juízes. A decisão sobre entrevistas é ambígua, tem conceitos vagos. 

A imprensa só pode ser responsabilizada pelo que o entrevistado disse se houver, à época da entrevista, indícios concretos de que ele mentiu. O que são “indícios concretos”? Há quem argumente que ou é indício ou é concreto. Mas pode ser que existam. Ninguém sabe exatamente o que são e sabemos agora que cada juiz pode decidir isso como bem entender.

Ficou imposta a lógica de que o juiz é que determina o que vai ou não estar na imprensa. E os juízes entenderam direitinho o recado da mesma forma que guardas da esquina entenderam os generais. 

A decisão do Paraná é resultado de uma sucessão de atropelos à liberdade. A primeira é a própria Assembleia Legislativa abrir procedimento contra um deputado que xingou o outro de corrupto. O dever do Legislativo seria o oposto, brigar até o fim para a garantia da imunidade do discurso do parlamentar.

Ocorre que o deputado arrumou uma prova. Num processo em segredo de Justiça, o colega que ele xingou de corrupto admitiu ter pedido propina. A pessoa que recebeu o pedido fez delação premiada e gravou as conversas. Esse material foi parar na imprensa.

Até outro dia, segredo de Justiça era dever dos funcionários do Judiciário e das partes. O jornalista não tem esse dever e tem a obrigação de divulgar informações de interesse público. Mas, vamos lembrar, acabaram as regras do país. Os juízes, tal qual os guardas da esquina, entenderam que eles agora fazem as regras em nome do que considerarem um bem maior.

Ficou decidido que as reportagens têm de sair do ar até o fim do processo, o que foi feito. Os veículos não podem mais tocar no assunto, sob pena de multa de R$ 50 mil. 

Nessa altura do campeonato, muita gente percebeu o perigo. Quem acreditou em algum ponto que atitudes do STF fossem apenas exceções começa a abrir os olhos. Infelizmente, do outro lado, gente que contestava as atitudes do Judiciário contra a liberdade de expressão, acha que agora está tudo certo.

Comparando laranja com bananas, muita gente que entende pouco do assunto diz que está assim há anos. Não haveria nada de diferente agora porque o Judiciário foi injusto de forma sistemática com influencers bolsonaristas. Vejamos o caso Monark para saber que há muito tempo está pior. 

Agora as coisas mudaram. Não falamos mais da Suprema Corte criando exceções injustas para punir militantes políticos que curtem ameaçar a família dos outros. Agora falamos de uma juíza plantonista inventando regras e contrariando o próprio STF para amordaçar a Rede Globo, a TV mais poderosa do país. Mudamos completamente de patamar.

Resta saber se tem volta.

Por: Madeleine Lacsko
Fonte: O Antagonista

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