Desembargador levou 10h em noite de feriadão para ler 208 páginas e assinar HC de Palermo

O ex-presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, desembargador Divoncir Schreiner Maran, levou aproximadamente 10 horas para ler o pedido e conceder o habeas corpus para o narcotraficante Gerson Palermo, condenado a 126 anos de prisão. Outro detalhe, a análise do recurso, com 35 páginas e 173 folhas anexas, ocorreu entre às 21h42 e ás 8h11 do dia seguinte, no meio do feriadão de Tiradentes em 2020.

Os detalhes são destacados no acórdão do Conselho Nacional de Justiça pelo ministro Luiz Felipe Salomão, corregedor nacional de Justiça e relator da denúncia contra Maran. O magistrado não foi afastado do cargo, mas vai responder procedimento administrativo por não ter respeitado etapas para liberar o bandido, como ouvir o Ministério Público, ter suprimido instâncias e não ter exigido exames médicos.

Apontado como um dos maiores criminosos da atualidade e apontado com um dos suspeitos de ser o mandante da execução cinematográfico do empresário Jorge Rafaat em Pedro Juan Caballero, Palermo aproveitou a saída do presídio, rompeu a tornozeleira e fugiu. Até hoje, três anos após o episódio, a polícia não tem pistas do seu paradeiro.

No acórdão publicado pelo CNJ, o relator destacou ainda os pontos mais controversos da decisão do ex-presidente do Tribunal de Justiça.

“Consta que o advogado do condenado ingressou com o Habeas Corpus no dia 20.04.2020, às 18:34, e o reclamado liberou e assinou a decisão liminar às 08:11 do dia seguinte (DOC 13). Por aí já se veria que houve um tempo rápido na análise da liminar, contados desde o protocolo, após pouco mais de 13 horas, e em horário incomum para apreciação e análise”, pontuou o corregedor.

No entanto, o pedido só chegou ao gabinete do desembargador às 21h42 da véspera do feriado. “Ocorreu que de acordo com o termo de distribuição da ação em plantão (DOC 14), o Habeas Corpus foi distribuído às 21:42 do dia 20.04. Seriam por volta de 10 (dez) horas ocorridas da distribuição até a liberação da liminar”, ressaltou Salomão.

“Numa rápida consulta à petição inicial e aos documentos que a acompanharam, verifica-se que ela possui 35 (trinta e cinco) páginas, acompanhada de outras 173 (cento e setenta e três) folhas de documentos, totalizando 208 (duzentos e oito) páginas, cuja análise ocorreu em dez horas e em horário incomum, pois se iniciou noite adentro do dia 20.04 e se estendeu até a madrugada do dia 21.04, não sendo demais recordar que como a decisão foi liberada às 08:11, por lógica ela foi elaborada em horário anterior”, destacou o relator.

“Claro que não é vedado ao magistrado plantonista a análise de casos em plantão em quaisquer horas do dia ou da noite. O reclamante já apreciou inúmeros casos em plantão judicial em diversos horários do dia ou da noite, mas eram casos de saúde, que envolvia a vida ou morte de enfermos ou recém-nascidos, e situações raríssimas de ações penais, mas não qualquer tipo de benefício a quem estivesse preso ou condenado sem seguir o procedimento comum, passando pelos filtros da Resolução 71/2009 do CNJ e do Provimento 306 do TJ/MS e mediante prévio parecer do Ministério Público”, observou o ministro.

“Também não é demais lembrar que a decisão liminar do Habeas Corpus ocorreu no último dia do plantão e que o impetrante somente ingressou com a ação no penúltimo dia. A demora da parte em ingressar com a medida no plantão, com todo o respeito, não pode de modo algum beneficiar o moroso, fazendo com que caso que não era de plantão o fosse ou ainda a justificar extrema rapidez no pedido, apreciação em horário incomum e em supressão de instância”, pontuou, sobre a estratégia exitosa da defesa.

“Se a parte opta em ingressar com uma medida em processo criminal que entenda urgente somente ao término do plantão, significa que o caso não era de plantão, fazendo com que o caso vá para a distribuição normal e daí ser analisado pelo juízo natural competente de primeiro ou segundo grau”, destacou.

Outro ponto destacado foi a rapidez no cumprimento da liminar do desembargador Divoncir Schreiner Maran. “Na decisão proferida pelo reclamado em plantão (DOC 15), consta na primeira página que a decisão foi encaminhada para cumprimento à primeira instância às 08:54 do dia 21.04. Este é mais um dado interessante, pois presume-se que haja diversas medidas apreciadas em sede de plantão em um feriado tão prolongado, mas aqui decorreu pouco mais de 40 minutos da liberação da decisão até o seu efetivo cumprimento, isto em tempos de trabalho remoto, via home office, em virtude da pandemia pela COVID-19, conforme autorizado por este E. Conselho desde meados de março deste ano”, frisou.

A Agepen (Agência Estadual de Gestão do Sistema Penitenciário) só cumpriu a decisão no dia seguinte, ao meio-dia. “De acordo com o extrato do sistema integrado das forças de segurança do Estado de Mato Grosso do Sul (SIGO), sistema esse que o reclamante e todos que atuam na área criminal têm acesso aqui no Estado, a tornozeleira foi colocada no condenado às 12:08 do dia 22.04, ou seja, já em data e hora de expediente normal”, relatou.

Mesmo assim, Palermo conseguiu fugir. O desembargador Jonas Hass da Silva reassumiu o caso e revogou a prisão domiciliar do criminoso. No entanto, ele já tinha rompido a tornozeleira e desaparecido.

Fonte: O Jacaré

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